Nha Nézinha gostava de sentar junto do povo jovem e de contar parte. Parte lá da terra do lá longe, parte de bandido fugido de bófia e caçado por mais bandido que a si, parte de quando Zé Mindelo a tinha ido pedir ao pai e com o nervo bebeu grogue demais e chorou de grosso e muita parte com filhinhos pequenos presos à saia e à chupa de mamã.
Gostava de agradar Fatuxa, filha codé (mais nova), única em casa cuidando. Embarrigara de Fatuxa já mulher partida pra velha e tivera choro grande de desgosto. Vergonha de mulher parida avó de netos homens feitos.
Nasceu de olho aberto e goela escancarada a cachopa. Havera de ser mulher pra vida dissera doutora que a trouxe pro mundo. E era. Professora diplomada, dessas de ensinar a ler e a escrever criança pequena e grandes também.
Até mamã já assinava o nome e lia cartas chegadas do lá longe. Mas o estado nunca mais mandava postal dizendo que tinha escola pra ela ensinar meninos. Então ela ia no shopping e ganhava arrumando tabuleiro de comida. Depois voltava e nha Nézinha lá estava, sentada, contando parte. Fatuxa ia só num instante comer bucha e trazer viola. Encostava na perna da mãe e tocava as mornas mais choradas do bairro.
Um dia, nha Nézinha não acordou mais. Fatuxa fez a trouxa, pegou na viola e foi pro lá longe. Era quase Fevereiro. Lá no Namibe ela foi ensinar. E contar bué parte também.
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