segunda-feira, 9 de março de 2009

por ler

Não gostar de ler é doença contagiosa, espécie de varicela de gente grande que pelo convívio infecta a miudagem, toma carácter crónico e corre sério risco de se tornar hereditária.

Conheço um rol de adultos com estatuto e bem na vida, respeitáveis homens e mulheres da classe financeira e até política que passaram os olhos pelos "Maias" e amargaram com "As viagens da minha terra" porque a tal foram obrigados. Em cada Verão passeiam os Paulos Coelho e as Margaridas Rebelo Pinto da moda conforme aderem às havaianas ou às madeixas platinadas. Mas tal como as roupas passam de época sem marcas de uso também os livros são arrumados na estante ainda por desflorar. ou folhear, tanto faz.

Tem nada a ver mas o meu Jorginho também não gosta de ler. Diz que gostava de gostar mas as letras fogem dele como se tivessem medo. Ele acha que as letras, as palavras e até as vírgulas já descobriram que ele não é flor que se cheire e não querem confianças com malvadezas e máscriações. Antes, quando tinha óculos de ver parece até os pontos de exclamação gostavam dele e nem ia tantas vezes de castigo nem para o atendimento, não fugia da escola nem dava mergulhos de pés nas poças da chuva. Quando voltava para casa, lia os horários das paragens de autocarro, a ementa do Café do Gaveto, a "Dica" da semana e os cartazes todos dos concertos do Tó Semedo, do Juka e até de gajos estrangeiros que tem que se pagar para lá ir abanar a carola. Depois os óculos partiram-se e estavam guardados na gaveta porque nas férias não se usam óculos de ver porque não fazem falta nenhuma e as miúdas nem gostam de putos caixa de óculos.

Na semana passada, a sogra da madrasta da mãe do Jorginho deu-lhe uns óculos que já não lhe serviam mas que a ele ainda estão de crescer. Já foram a apertar ao oculista mas continuam com um problema. Estão impecáveis, como novos, têm os vidros inteirinhos e transparentes tal e qual quando as janelas lá de casa acabam de ser limpas com "Ajax", mas as letras continuam a fugir para todos os lados e às vezes parece até ficam nubladas como se as lentes tivessem embaciado.

Numa tarde destas, lado a lado, porque aos 12 anos já não se tem idade para andar de mão dada, passeámos por aí e pedimos aos amigos e conhecidos com óculos que nos deixassem experimentar os seus gafarros para ver se nos assentavam bem. Uns ficavam, outros nem por isso mas o bom da coisa foi o Jorginho ter descoberto por si próprio que as letras não têm nada contra ele, os vidros dos óculos é que mesmo limpinhos e brilhantes não são iguais uns aos outros. Truques!!!

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