Numa das muitas vezes que fui ao aeroporto esperar alguém os nossos olhares cruzaram-se, meio sorridentes meio cumplices, como se já noutras paragens se tivessem encontrado. O voo atrasou como quase sempre atrasam os que de lá vêm e entre idas e vindas os nossos olhos brilhavam de uma para a outra.
Quando já escutava as aventuras e desventuras dum amigo em terra distante, li-lhe medo de relance, na mão enrugada que me acenava despedida. Estendi-lhe a minha, abrimos os braços e apertámo-nos como avó e neta a quem a saudade aperta. Só então percebemos, ela incluida, que Nha Jula estava há várias horas no átrio do aeroporto da Portela, aguardando uma filha que ignorava a sua vinda, porque, na ânsia do partir se esquecera de a avisar.
Nha Jula tem a sapiência de quem já viveu 87 anos, apresenta porte altivo nas suas sete saias engomadas e cabeça coberta pelo tradicional lenço branco, um par de olhos azuis a se cobrirem de névoa e uma inocência bonita de menina travessa que praticamente voa em cadeira de rodas. Ela sabia que a filha se chamava Amélia e que morava em Lisboa, numa casa amarela de onde se via o mar longe, longe, quase até Cabo Verde. Recordava-nos a todo o instante que a sua maleta não tinha nome porque não o sabia escrever mas estava marcada pelo cinto xadrezado da sua segunda saia de baixo.
De balcão em balcão, de corredor em corredor, telefonando, perguntando, melgando uns e outros, cá e lá, Nha Jula cumpriu o desejado: seis meses de belas férias com a família espalhada por todo o Portugal, Feira do Relógio, Colombo e Fátima incluidos.
Um dia destes ela vai voltar e trazer de novo a maleta cheia de garrafas de manteiga(!), feijão congo, atum, milho, linguiça e bolacha capitão. Vamos a ver é se não se esquece de avisar a malta.
Um dia destes ela vai voltar e trazer de novo a maleta cheia de garrafas de manteiga(!), feijão congo, atum, milho, linguiça e bolacha capitão. Vamos a ver é se não se esquece de avisar a malta.
2 comentários:
e pensar que me convenceste a telefonar para os gabinetes dos bairros a perguntar as cores dos prédios. aqui o chefe é que ficou como maluco. tu não existes. vou querer ver é como é que a manteiga sai da garrafa para barrar o pão. beijo. francisco
Pois é Francisco, e não é que era mesmo no teu concelho. Casalinho da Ajuda, meu caro. E quanto à manteiga é pôr ao sol, em banho maria ou noutro qualquer calor e ir derramando. Obrigada por tudo.
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