quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

parece o ano vai mudar

Parece é neste dia que se costuma fazer assim uma espécie de revisão da matéria dada e plano de acção a contar já a partir do amanhã de manhã ou do ainda hoje se o estado da matéria o permitir.

Foi. 2008 foi assim tipo mais ou menos que tal e coiso foi andando com dias melhores e piores e outros que nem por isso.

Aos tantos que me permitiram fazer parte das suas vidas mesmo em dias de más disposições e repentices, que cravei sem dó nem piedade e moram lá no fundinho do meu coração aquele abraço apertado e a gargalhada fácil do costume. Continuem a ter paciência e a estarem aí.

Às nossas meninas do andebol, frescas, giras, atrevidas e ganhadoras só peço que continuem a dar o vosso melhor na escola, no trabalho e no campo e, já agora, se ficassem nos primeiros lugares do campeonato até que era fixe.

Ao resto dos que fazem a Assomada acontecer todos os dias: Andreia, Xando e Zé nos treinos, Carlota e suas rabentolas e ferramentas, grandes batucadeiras e fantásticos ferro e gaita, Hélder e demais voluntários da sala de estudo, malta da percussão e todos os que uma forma ou de outra têm vestido a nossa camisola, continuem. É bom podermos contar com vocês.

Muito obrigada ao pessoal da Companhia de Actores pelo BIG voto de confiança que foi o vosso convite. Essa foi a grande surpresa do meu 2008. Aquele abraço! Estamos aí!

À malta do Ampliarte, aos meus explicandos de matemática e estatística, aos jovens que vou melgando e abraçando, que sempre se entregam de brilho no olho e que me permitem continuar a acreditar que sonhar é possível e que futuros risonhos hão-de amanhecer, muita pica, sempre!

Mana, bora lá ganhar juízo e ter vida!

Rapaziada, um dia destes a vida vai mudar e vocês vão ter mãe a sério, daquelas assim tipo normais e que chegam às 17:30h, não param de vos atazanar a cabeça e inventam programas fixes de ir passear ao shopping e fazer formações de auto-ajuda ou qualquer coisa acabada em terapia aos fins-de-semana.
Vocês são mesmo os maiores por me adorarem, por me aturarem e irem atrás de todas as minhas loucuras. Amo-vos!

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Logo hoje ...

A neblina envolve-me pelas ruas da minha cidade. Os raios de sol, difusos confundem as pedras da calçada, as gaivotas, de bicos escancarados, pairam ao sabor da ventania. Logo hoje que já estou de abalada.

Quero ir e quero ficar. É sempre assim. Quero a vida e o aconchego dos dois lugares. O mar de lá é frouxo, sem alma, sem cheiro, sem som, mas a gente, a minha gente, é quente de alma e coração, cheia de ritmo e de vida até em dias de agrura. Lagos é o regresso ao berço de paz, ao abraço demorado da minha mãe e à descoberta de sensações adormecidas e despertadas de praia em praia, ao sabor da maresia e da mudança das marés.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Hoje dia não

Amanheci cinzenta, como o céu, ou então foram as nuvens que entraram no meu tom para me não contrariar.
Redimi-me dum ano inteiro de impaciências e crises de mau feitio de braço estendido, no serviço de sangue dum hospital, deixando-me sugar para bem alheio. Há quem se confesse ...
Arrastei-me de lá com todas as memórias de dor e de esperança que o lugar já me deu. Retemperei forças num areal deserto, ao rugir do Sueste, trincando ora nozes ora chocolate negro e afogando mágoa, à falta de tinto, num pacote de sumo de maracujá, nectar da paixão sem ela.
Volto à estrada num carro que não queria meu. Os meus pés, acostumados a pedais de machimbombo deixam-no ir abaixo todas as vezes que não devia. As três horas de espera são duras de roer. O cd do Zeca Afonso em vozes alheias roda e torna a rodar e, quando, lá na inspecção, chamam o proprietário do veículo tal e ouço o meu nome, a resposta foi a mesma de quando perguntaram a quem se destinava o sangue: golpe fundo, de morte.
Sem querer abri pranto e rolei, rolei, serra acima até o nevoeiro não mais me deixar seguir até à Foia. Ouvi o silêncio na penumbra do vale e o eco do meu choro de volta.
Parece só hoje te enterrei, pai.

domingo, 28 de dezembro de 2008

Por mim



Quiz desejando e parece fui capaz.
O sol voltou, de mansinho. A minha Meia-Praia encheu de tanto mar e o papagaio novo aprendeu a voar no céu de Alvor. Meio nublado. Chorando maresia. Ecoando fúria como o meu búzio de estimação.
Do céu cairam paraquedas de mil cores. Desejei ser um deles e voar por aí.
Da noite rompeu a "Lua", gemida pelo trompete do Tomaz Pimentel e a voz do Zé Manel. Kompanhêra di solidão. Testemunha de vida.
Quiz ...

sábado, 27 de dezembro de 2008

Desejando ...



Parece que também a chuva me trouxe desejo de desejar. Costuma só trazer desejo de acabar depressa ou, se a vida deixa, desejo de ir estrada fora até uma qualquer ravina de mar áspero e senti-la viva, a bater forte na chapa e no vidro da carrinha, manta quente sobre as pernas com musiquinha a acompanhar e, às vezes, quase num laivo de loucura, desejo de me enfiar no velho impermeável vermelho e ir indo, chapinhando, deixando-a lavar cabelo, corpo e alma, sentindo o vento que sempre sopra do lado de lá da Peninha, em busca de liberdade.

Tenho sede.

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

Natal em Lagos

Isto do Natal com frio faz parte do quadro da quadra, mas não é pra mim. Sempre venho com esperança de que o Inverno ainda não tenha chegado a Lagos, que o sol não durma tão cedo por estas bandas ou até que uma suestada valente tenha aquecido o lugar assim tipo micro-ondas a bafo de vento forte. Isto do Inverno dá-me sempre vontade de emigrar e ir d'encontro ao calor e às águas salgadas e cálidas dum lugar qualquer mais chegadinho ao equador.

Porque raio é que a tijoleira, que é bonita, é um facto, tem que revestir todos os pedaços de chão aqui de casa e permitir que o frio me entre pelos pés e suba, suba, até quase deixar de sentir todas as partes do corpo?

Sobreiluminaram a minha cidade num bom gosto algo duvidoso. Uma passagem de arcadas em tons de azul e branco qual caminho para o paraíso, calçada atapetada de vermelho e pais-natal ladrões pendurados até nas sacadas mais bonitas do centro histórico. Deserto. Frio. Abandonado.

Os sapatos de toda a gente adormeceram sobre o fogão da cozinha e acordaram recheados das coisas boas que fazem crescer sorrisos e sonhos: gulodices, alvo de setas, papagaio de papel, cartas de mimos e de amor e as cuecas e meias que, acho eu, marcam presença em todos os sapatinhos lusos.

A euforia da madrugada do 25 de Dezembro faz parte do meu imaginário infantil, a magia doce de não querer saber a verdade, o nervoso miudinho do rasgar do embrulho, o deslumbramento da descoberta e o sorriso gaiato do meu pai que, de olhos ao céu, sempre dizia: "Obrigado Menino Jesus" - nunca querendo saber quem tinham sido os ofertantes.

Também este ano mantivemos esse gozo das surpresas na manhã do dia de Natal, agora com a nostalgia da falta do seu maior entusiasta. É. Custa bué. Levei-lhe o possível, uma flor roubada num canteiro da avenida. Fechei os olhos e as lágrimas correram sem fim. Senti-o presente. Acho está cá dentro, no aconchego do meu coração.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Desejos

Parece o frio me trouxe desejo de desejar. Costuma trazer desejo de manta quente, de ronha de não escutar despertador a gritar "alvorada", de saudade e de aperto assim apertado no peito que vai subindo e fica logo abaixo da goela, a não querer deixar passar o que vem de cima.

Não é desejo de desejar embrulhos de papel bonito e laçarote reluzente. Nem desejo de faz de conta darmos todos as mãos e sermos todos amigos. Nem desejo de pegar numa agulha e coser o buraco de ozono com pontos muito muito apertadinhos.

É desejo de mim.
Parece o frio me vem lembrar do querer ser mulher.
Velas acesas sobre linho crú. Flores? Brancas. À velocidade duma brisa suave, entrefecho os olhos e desejo sopro quente de vida. Afago. Palavras. Silêncios.
Tenho frio.

domingo, 21 de dezembro de 2008

Vidas...

Os dias galopam uns a seguir aos outros.
Tem vezes se atropelam: segunda ultrapassa terça e quando julgo ser quinta afinal já estou a chegar no sábado. Mas parece o Inverno vai trazer assim um tempo de calma e descanso. Chega esta madrugada, não é? Ou será também ele atrasou e este sol radioso já ou ainda é duma qualquer Primavera? Seja o que fôr eu agora tou no ir. Abalar por aí abaixo com a rapaziada, uma boa sacada de livros, desejosa de me enroscar nas dunas da minha Meia-Praia e deixar-me embalar pela música que onda a onda ele vai trazendo.

Neste tempo fugaz o tanto aconteceu. Cruzamo-nos por aí. Desconsegui travar.

O alegre Domingos morreu, a assustada Amélia quase pariu ali na rua, encantei com as estórias e as estigas do Ondjaki, entreguei-me à magia do "Perlimpimpim", descobri a costura em bonecas de trapo, degustei responsabilidade social, embaracei variância com desvio padrão e baralhei angústias com o verbo abraçar.

Quiz desejando e não fui capaz. Quiz apanhar o eléctrico amarelo e ir d'Algés ao não sei onde espreitando luzes e sonhando acordada. Quiz acordar a caminho do Cabo Espichel e ir amanhecendo campos fora, de encontro ao mar. Quiz entrar pela noite enlaçando uma morna chorada di kretcheu. Só quiz ...
Vitórias e derrotas. Tristezas e alegrias. Vidas ...

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Santa Catarina

Dias e dias saltimbancando por aí, entre vidas e estórias que já nem sei donde vieram e como me chegaram.

Festa de Santa Catarina na Outurela. É um dos momentos em que sinto viver África sem sair do meu poiso. Muitas semanas antes começam as reuniões e as suposições do que será necessário para que a próxima seja a melhor Santa Catarina de sempre. Sempre se quer melhor.

Na véspera a correria acelera. Comprar flores, comida e bebida. Conferir licenças. Montar e entregar tendas. Já mais à tardinha, preparar o andor, descascar e picar dezenas de quilos de alhos e cebolas e começar a cozinhar, arrumar centenas de cadeiras, verificar detalhes enquanto o côro dá os últimos acordes do ensaio. A noite que se quer longa parece acabar num ápice e logo logo já é hora de recomeçar o que ainda não acabou. As panelas continuam ao lume. O cheiro dos cominhos e do louro enche o ar e os óculos embaciam à entrada na cozinha. Sempre bem recebem quem chega. Cantoria, abraços e beijos entre piropos e algum agrado.

A imagem de Santa Catarina já tinha pernoitado no pavilhão. Chegou de véspera, aos ombros de jovens estudantes, que vieram dos muitos lugares de Portugal onde estudam em resposta ao cumprimento de uma tradição.

O coro dirigido pela D. Domingas fez as honras da casa e animou a missa, presidida pelo Bispo do Mindelo, D. Arlindo, acompanhado pelo Bispo de Lisboa, pelo nosso Padre Zé Manel aqui da Outurela, pelo Padre Dex, representante da comunidade angolana, pelo capelão da Marinha Portuguesa, entre outros celebrantes.

As oferendas chegaram ao altar pelas mãos de jovens do bairro, numa dança ondulante, marcada pela batucada e pelo sentimento expresso nas palavras ditas e cantadas. Ao altar levaram o que espelha a comunidade onde vivem: o tijolo e o martelo do trabalho árduo de todos os dias que traz sustento às famílias, o livro e a bola da educação dos filhos que esperançam melhor que a sua, o pano di terra e o violino como símbolo da alegria e da cultura de origem que fazem por manter viva nos respectivos seios familiares e o sempre cesto de vime repleto de fruta fresca, mandioca, feijão e maçaroca que pedem não falte em cada dia.

Um mar de gente. Mil, dois mil, quatro mil. Não sei, perdi-lhes o conto. Tantos quantos os pratos de cachupa, de feijão, de massa de milho, de canja, de alegria, de coragem e de boa vontade que passaram de mão em mão.

Manhã cedo, tarde fora, noite dentro.
 
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