sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Santa Catarina

Dias e dias saltimbancando por aí, entre vidas e estórias que já nem sei donde vieram e como me chegaram.

Festa de Santa Catarina na Outurela. É um dos momentos em que sinto viver África sem sair do meu poiso. Muitas semanas antes começam as reuniões e as suposições do que será necessário para que a próxima seja a melhor Santa Catarina de sempre. Sempre se quer melhor.

Na véspera a correria acelera. Comprar flores, comida e bebida. Conferir licenças. Montar e entregar tendas. Já mais à tardinha, preparar o andor, descascar e picar dezenas de quilos de alhos e cebolas e começar a cozinhar, arrumar centenas de cadeiras, verificar detalhes enquanto o côro dá os últimos acordes do ensaio. A noite que se quer longa parece acabar num ápice e logo logo já é hora de recomeçar o que ainda não acabou. As panelas continuam ao lume. O cheiro dos cominhos e do louro enche o ar e os óculos embaciam à entrada na cozinha. Sempre bem recebem quem chega. Cantoria, abraços e beijos entre piropos e algum agrado.

A imagem de Santa Catarina já tinha pernoitado no pavilhão. Chegou de véspera, aos ombros de jovens estudantes, que vieram dos muitos lugares de Portugal onde estudam em resposta ao cumprimento de uma tradição.

O coro dirigido pela D. Domingas fez as honras da casa e animou a missa, presidida pelo Bispo do Mindelo, D. Arlindo, acompanhado pelo Bispo de Lisboa, pelo nosso Padre Zé Manel aqui da Outurela, pelo Padre Dex, representante da comunidade angolana, pelo capelão da Marinha Portuguesa, entre outros celebrantes.

As oferendas chegaram ao altar pelas mãos de jovens do bairro, numa dança ondulante, marcada pela batucada e pelo sentimento expresso nas palavras ditas e cantadas. Ao altar levaram o que espelha a comunidade onde vivem: o tijolo e o martelo do trabalho árduo de todos os dias que traz sustento às famílias, o livro e a bola da educação dos filhos que esperançam melhor que a sua, o pano di terra e o violino como símbolo da alegria e da cultura de origem que fazem por manter viva nos respectivos seios familiares e o sempre cesto de vime repleto de fruta fresca, mandioca, feijão e maçaroca que pedem não falte em cada dia.

Um mar de gente. Mil, dois mil, quatro mil. Não sei, perdi-lhes o conto. Tantos quantos os pratos de cachupa, de feijão, de massa de milho, de canja, de alegria, de coragem e de boa vontade que passaram de mão em mão.

Manhã cedo, tarde fora, noite dentro.

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